[Crónica] Netflix – isto era para ser um monopólio natural

CRÓNICAS/OPINIÃO Hugo Rajão

Num tempo em que as séries eram um exclusivo televisivo, o prazer de assistir a um episódio vinha quase sempre acompanhado de um amargo de boca, o de ter de esperar uma semana pela continuação da história.

Havia, portanto, uma necessidade do consumidor por atender. A de não esperar por episódios, a de não ser interrompido. As boxes de DVD e as maratonas providenciadas, de quando em vez, pelos canais revelaram essa necessidade. Os downloads piratas de temporadas inteiras revelaram a plataforma ideal para atendê-la – a internet.

É dessa junção que se explica o sucesso da NETFLIX. O acesso imediato, sem espera, de pelo menos uma temporada de uma série. Quando o consumidor quiser e não no tempo indicado pelo Guia de TV. Parece o negócio perfeito.

No entanto, a NETFLIX vem perdendo utilizadores. O que se passou?

O modelo da Netflix para funcionar na perfeição precisaria de ser um monopólio. Felizmente já não é.

Hugo Rajão

Se o cliente gostar de uma determinada série, a plataforma que a exibe garante, à partida, a sua fidelização até ao término da mesma. Só que enquanto na TV o canal, na medida em que controla o ritmo de exibição e consequente ritmo de consumo, controla também o tempo de fidelização, as plataformas digitais, em virtude do seu modelo, não têm a mesma facilidade. Se a “necessidade” de maratonar uma série torna a adesão à NETFLIX apetecível, a possibilidade de consumo imediato assegura, na mesma proporção, a fidelização do cliente por um período muito curto (até este terminar de ver).

Então como é que só agora é que a NETFLIX começou a perder clientes? Por ser, até há relativamente pouco tempo, a única plataforma a oferecer este tipo de serviço. Até então não interessava muito se um cliente já não encontrava mais nada, do seu interesse, para ver. Tinha a expetativa de que a próxima série que lhe viesse a interessar iria “cair” na NETFLIX. Por conseguinte, não via motivos para cancelar a subscrição. A plataforma só teria de garantir alguma regularidade na atualização do catálogo.

Com o surgimento de plataformas concorrentes o caso muda de figura. Da mesma forma que com a NETFLIX, ao contrário da TV, não tem de esperar por episódios, com o aparecimento de novas plataformas, o cliente deixou de ter de esperar pela NETFLIX para encontrar, para si, uma nova série.  Pode subscrever “aqui”, cancelar “ali”, voltar a subscrever “aqui”, ao sabor das suas preferências. Logo, a fidelização torna-se volátil. Moral da história: o modelo da NETFLIX para funcionar na perfeição precisaria de ser um monopólio. Felizmente (já) não o é.

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