[Editorial] Ambiente em tempo de guerra

CRÓNICAS/OPINIÃO Diretor

O ciclo anual do movimento terrestre em torno do Sol, que determina a sucessão das estações do ano, traz-nos, dentro de dias, mais um solstício de verão. É ele que nos oferece um período de festas e celebrações que é continuação de antiquíssimos rituais e tradições com que, ao longo de séculos, se celebra o fulgor da natureza, a abundância dos frutos da terra, o sol no seu esplendor, os dias longos, a vida tranquila.

Tempo de festividades populares que, contudo, noutras paragens da Europa e do mundo é aproveitado para intensificar guerras sanguinárias, já que as condições climatéricas favorecem a movimentação dos meios e proporcionam oportunidades para destruição maciça de forma mais eficaz. Não pára a agressão russa ao território ucraniano e as intromissões ucranianas recentes em solo russo só podem fazer prever o prolongamento da barbárie e uma escalada da guerra para um nível de destruição ainda maior.

A guerra, toda e qualquer guerra, é contrária ao sentido da celebração do dia mundial do ambiente, que ocorreu no dia 5. A guerra produziu e vai continuar a produzir danos ambientais graves e, após cinquenta anos de celebração deste dia, não parece ter sido obtida mudança da consciência ambiental dos senhores da guerra. Destruir uma barragem é crime ambiental. E ninguém pode assegurar que as centrais nucleares não correm riscos de danos com gravíssimas consequências para o ambiente.

Por cá, há decisões políticas condicionadas pela tentativa de tornar compatíveis posições situadas em polos opostos do interesse comum. Veja-se a questão do lítio, indispensável para o fabrico de baterias e os riscos ambientais que a população de Covas do Barroso e do concelho de Boticas justificadamente receiam com a sua exploração. As promessas de mitigação dos inconvenientes serão credíveis e terão garantias de eficiência?

Outras decisões trazem esperança. Foi notícia o início da limpeza e recuperação ecológica do rio Leça, uma empreitada de 4 milhões de euros para 71 km de margens, nos concelhos de Santo Tirso, Valongo, Maia e Matosinhos. A empreitada deveria estar concluída até final deste ano mas, como é habitual, o prazo será prorrogado.

Já a empreitada de mais de um milhão de euros tendo como objetivo a “Valorização do corredor ribeirinho entre os Rios Ave e Vizela – Parque Urbano Sara Moreira ao Parque do Verdeal”, adjudicada em abril passado para execução num prazo de nove meses, estará provavelmente pendente de visto do Tribunal de Contas, o que estenderá os trabalhos por longo tempo. Retirar resíduos e plantas invasoras, reestruturar e replantar as margens, reconstruir açudes e facilitar o repovoamento de peixes são metas ambientalmente preciosas para estes rios que estiveram entre os mais poluídos da Europa. Haja a esperança de que também o Ave e o Vizela venham a ter intervenções da nascente à foz, como no caso do Leça. E que assim possam os nossos rios vir a ser usados sem receios como eram antigamente, quando as águas eram límpidas e as margens acessíveis.

Muito antes de ter uma praia dita urbana, sem acesso ao rio, Santo Tirso teve praia no rio. No Parque do Verdeal, o acesso ao rio Vizela está cuidadosamente vedado por gradeamentos que poderão um dia ser abertos. No Amieiro Galego, a nascente termal podia ligar-se ao rio Ave por um tanque-piscina de uso livre… Recuperar e dar vida aos rios Ave e Vizela devia tornar-se objetivo comum de todos os municípios ribeirinhos não para um dia mas para uma década inteira dedicada ao ambiente.

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