[Opinião] Não paramos de falar sobre o direito à habitação

Ana Isabel Silva CRÓNICAS/OPINIÃO

Os números sobre habitação em Santo Tirso revelam uma realidade preocupante deste direito tão fundamental. Temos quase 5.500 inquilinos no concelho e simultaneamente 3.300 casas vazias. Santo Tirso não chega atualmente sequer à média de 2% de habitação pública, média nacional. Média essa que fica bastante aquém dos 10% no conjunto da UE, e ainda mais longe de exemplos como Holanda que tem 30% de fogos públicos ou a Dinamarca com 20%. Numa rápida análise no Idealista um T2 para compra no concelho de Santo Tirso tem um preço médio de 158 mil euros. Para arrendar um T2, 700 euros é dos preços mais baixos. Mas muitas vezes para além dos preços elevados temos o problema de nem sequer haver oferta ou quando há passado pouco tempo o objetivo é vender e não arrendar.

As autarquias têm um instrumento bastante poderoso para fazerem o levantamento das condições habitacionais do concelho assim como para fazer um plano de ação para resolver as carências identificadas. Este instrumento é a Estratégia Local de Habitação. A autarquia de Santo Tirso chegou tarde no uso desse instrumento tendo apenas elaborado o mesmo durante a última campanha autárquica. A Estratégia Local de Habitação ficou assim atrasada por mais de 3 anos.

No panorama nacional foram identificadas com necessidade de realojamento, ou seja, com carências habitacionais, 25.762 agregados familiares. Sabem quantas famílias identificou a câmara de Santo Tirso? CINCO. Demonstrando uma enorme insensibilidade política perante o sofrimento de milhares de pessoas sem habitação digna. Talvez percebendo o ridículo da sua previsão, o Executivo recuou e colocou na Estratégia Local de Habitação o número de 607 famílias com problemas habitacionais, certamente mais próximo da realidade. Se então o executivo reconhece que 607 famílias tirsenses necessitam de realojamento seria apenas sensato assumir que iria colocar nesta Estratégia Local de Habitação um número perto deste de novos fogos habitacionais. Mas o Executivo municipal escolheu construir apenas 54 novos fogos e adquirir 46 fogos. Quando os novos 54 fogos municipais estiverem construídos e 46 comprados, a habitação social no concelho passará de 1,68% de todo o parque habitacional para apenas 2% de todos os fogos no concelho. É um número escandalosamente baixo quando um dos mais importantes objetivos do programa 1.º Direito é justamente aumentar para 5% o parque habitacional público!

Assim é fundamental mudar o curso das políticas municipais. É necessário construir ou adquirir pelo menos 714 novas habitações sociais, a juntar aos 520 fogos públicos já existentes. E com 1.234 casas municipais e do IHRU, a proporção de habitação pública em Santo Tirso seria apenas 4% dos 30.854 alojamentos existentes, ainda abaixo dos 5%. É urgente refazer a Estratégia Local de Habitação.

Quanto a financiamento, há que lembrar que a UE, pela primeira vez na sua história, aceitou que fossem atribuídas verbas públicas para a habitação social. Há vários autarcas no país que não aceitam a definição técnica da OCDE: “habitação social é aquela cuja atribuição e preço não são definidos pelo mercado”, mantendo a visão salazarista da habitação social como casas para os pobres, de baixo preço e má qualidade. Nada de mais errado como mostram muitas cidades europeias como Viena, Amesterdão, Copenhaga ou Manchester. Sem uma oferta robusta de fogos públicos com rendas acessíveis para jovens casais e outras pessoas com pequenos rendimentos, o município de Santo Tirso não atrairá mais população e não alcançará a curto prazo os índices de desenvolvimento económico e social que o século XXI exige.

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