[Crónica] Pode alguém ser quem não é?

CRÓNICAS/OPINIÃO Fátima Pacheco

Neste mês de abril foi um espaço-tempo de práticas de vida bem diferentes. Depois de Aparecida do Norte, rumei até ao estado da Bahia e vivi experiências muito especiais em terras de Pindorama, nome atribuído pelos indígenas tupiguarani antes da chegada dos portugueses e que significa terra de muitas palmeiras.

Foi tempo de refletir por que dizemos que descobrimos o Brasil quando este lugar já existia e tinha pessoas que nela habitavam. Refletir sobre o conceito de ciência que estudamos nas nossas escolas e aquela que os povos indígenas sempre souberam ter pois conhecem a natureza, preservam-na e sabem o que cada planta, árvore ou erva oferece para a sua/nossa saúde.

Recordo que estudamos também que as pessoas que viviam nas florestas, porque não se vestiam como nós ou até não se vestiam mesmo, não eram civilizadas. Aprendi que civilização existe em todos os lugares e cada povo tem o seu saber ancestral que carrega em seu DNA. Aprendi que os europeus se perderam na soberba de um saber que construíram a partir da sabedoria que tomaram emprestado dos povos africanos sem lhes dar a devida referência. Falamos da cultura grega e esquecemos que muito dela está impregnada de conhecimentos anteriores a ela.

“Aprendi que os europeus se perderam na soberba de um saber que construíram a partir da sabedoria que tomaram emprestada dos povos africanos sem lhes dar a devida referência”

Fátima Pacheco

Vivi rituais com cânticos que falam da ciência do indígena, do seu conhecimento da natureza, dos rios e da importância de preservar as matas ciliares, da terra que nos fornece todos os elementos que nos alimentam quer o corpo quer a alma, do mar que necessitamos cuidar e que está tão repleto de plásticos cujas partículas já estão a entrar na corrente sanguínea dos humanos, dos animais que preservam os ecossistemas cuja caça desregrada e por lazer pode destruir o equilíbrio das florestas, das plantações de sementes transgénicas carregadas de pesticidas que matam os insetos que geram harmonia e fazem polinização. A exemplo dos rituais católicos todas as restantes religiões ou agrupamentos espiritualizados fazem seus rituais próprios. Julgamos que o que não for igual ao que nós fazemos não é manifestação de civilidade. Que engano. Teremos de aprender a abrir nossos horizontes e descobrir o que o Outro nos pode ensinar.

E como pode alguém ser quem não é… vou-me abrindo a algo novo, ao desconhecido, mas que pressinto ser importante descobrir, principalmente, dentro de mim.

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

5 × 4 =