[Crónica] Pode Alguém Ser Quem Não É?

CRÓNICAS/OPINIÃO Fátima Pacheco

Cheguei a Pindorama, ou seja, “Terra das Palmeiras”. Este é o nome que a literatura indigenista dá ao que os portugueses chegados pela primeira vez a este lugar chamaram de “Terras de Vera Cruz” e que mais parte se transformou em Brasil dada a importância da árvore Pau-Brasil, cujo corante vermelho era extraído de seu tronco e era usado para tingir tecidos. Interessante é que conhecemos os nomes de localidades, ruas ou lugares, mas nunca refletimos sobre as suas origens, tão pouco do porquê de seu uso. À medida que vou convivendo com diferentes pessoas vou descobrindo novos mundos de conhecimento e tentando compreender outros modos de olhar os mesmos objetos.

Procuro um eixo de pensamento para a minha escrita e recordo de tudo o que deixei para trás após embarque. Ficaram entes queridos, uma linguagem que julgo dominar, uma geografia e uma história que faz parte intrínseca do meu ser. Deixo também uma política que me desgosta. De um lado uma governação que poderia dar segurança por sua configuração no parlamento e de outro uma oposição que teima em questionar essa legitimidade, criando fatos que embora sejam da ordem da democracia, se tornam de ordem da disrupção. Tudo parece sempre errado. Mesmo precisando recuperar o que foi perdido em tempos de grande crise económica, sente-se que há necessidade de deitar por terra outras conquistas. Talvez o defeito seja meu e sinta alguma melancolia pela vontade de ver um Portugal melhor, ou um Portugal que só está no meu imaginário.

Aqui a insegurança mantém-se. Todos brigam com todos. Não se discutem ideias e valores que se pretendem para o país. Impera a gritaria, o insulto, a ironia, a ameaça. E se isso acontece entre a população é reflexo do que acontece nos órgãos representativos políticos. A exemplo de Portugal também há Comissões Parlamentares de Inquérito (CPI) no congresso brasileiro. As discussões são esdrúxulas pois cada um não é capaz de escutar o outro, uma vez que já há uma pergunta elaborada mesmo que a resposta já esteja contida na anterior. Gira-se num mundo que é surdo. Fica evidente a nossa incapacidade de viver em comunidade. Não se consegue pensar no bem comum. Age-se individualmente refugiando-nos no que consideramos ser a nossa verdade. Cá usa-se uma expressão interessante para o final dessas CPIs ou qualquer outro tipo de discussão que precise de alguma decisão final: “acaba tudo em pizza”. Um dia explicarei a origem dessa expressão…

E como pode alguém ser quem não é continuo na esperança do retorno à humanização que parece estarmos perdendo aos pouquinhos sem que nos apercebamos.

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