[Opinião] E se, ao invés dos limites do humor, nos preocupássemos com os limites da violência?

Ana Isabel Silva CRÓNICAS/OPINIÃO

Na cerimónia dos Óscares de 2022, a 28 de março, assistimos a um acontecimento que tem, incrivelmente, dividido a sociedade sobre os possíveis limites do humor. Chris Rock, um famoso comediante, fez um espetáculo de comédia durante a cerimónia. Um dos alvos das suas piadas foi Jada Smith. Esta foi comparada à protagonista do filme “Até ao Limite da Honra” pelo seu cabelo rapado. No entanto, é conhecida a razão pela qual Jada Smith tem o cabelo rapado. A atriz tem uma condição denominada alopecia que causa perda de pêlo do couro cabeludo. Jada claramente não achou graça à piada, o que foi logo percecionado pelo seu marido, Will Smith. Este, para surpresa de todos, levantou-se logo após esta piada, dirigiu-se ao palco e agrediu o comediante.

No seguimento desta agressão, duas barricadas opostas se formaram na sociedade. Os que defendem a liberdade de expressão do comediante agredido e quem tentou defender a existência de limites no humor e a legitimidade da agressão. Limites, sim. Mas sobre o quê exatamente?

“Num gesto que alguns consideraram protetor em relação à mulher, esconde-se à vista de todos numa performatividade e violência que é sempre condenável”

Ana Isabel Silva

Antes de falar sobre a existência ou não de limites no humor, importa analisar a atitude de Will Smith. Num gesto que alguns consideraram protetor em relação à sua mulher esconde-se à vista de todos uma performatividade e violência que é sempre condenável. Passar a mensagem que uma ofensa apenas se resolve com uma resposta violenta é, isso sim, ultrapassar os limites. O agressor ainda foi receber o prémio de melhor ator e, em palco, pediu desculpa a todos menos ao agredido. Justificou também a sua atitude com o “amor”, que “nos leva a fazer coisas doida”. Até o seu pedido de desculpas se baseou na justificação que vários agressores utilizam.

Como referiu em entrevista o comediante Bruno Nogueira, se qualquer outra pessoa tivesse entrado naquela cerimónia para agredir algum participante teria sido expulso de imediato e levado a uma esquadra. Não só Will Smith não foi expulso como permaneceu até ao fim de toda a cerimónia. Cris Rock foi obrigado a ficar sozinho no palco e lidar com o público até ao fim do tempo do seu espetáculo.

O lamentável episódio é mais um eterno retorno ao debate sobre os limites do humor. É claro que o humor tem limites, o principal deles é fazer ou não rir uma plateia. Mas e se, ao invés dos limites do humor, nos preocupássemos com os limites da violência?

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