A palavra socialismo carrega ainda estigmas fortes na Europa e ainda mais nos Estados Unidos. Há alguns (ainda poucos) socialistas dentro do partido democrata americano. Depois da candidatura presidencial de Bernie Sanders, o movimento socialista inspirou milhares de pessoas por todo o país. Desse movimento saíram eleitos como Alexandria Ocasio Cortez e mais tarde Rashida Tlaib. Continuam a ser uma percentagem pequena, no partido e no congresso. No entanto, nas últimas eleições locais (o equivalente as nossas autárquicas), tiveram vitórias importantes.
A mais falada foi a de Zohran Mamdami para presidente de camara em Nova Iorque. Começou com 1% nas sondagens e em menos de um ano ganhou as eleições. Assumidamente socialista, muçulmano, com 34 anos e imigrante, conseguiu mais de 1 milhão de votos e o maior número de votantes de sempre.
As suas propostas, consideradas radicais, eram de construção de casas públicas, mais casas com renda controlada, supermercados públicos com preços mais baixos, substituir policias por assistentes sociais em casos não violentos relacionados com sem abrigo e pessoas com problemas mentais, transportes rápidos e gratuitos e creche gratuita.
A verdade é que apesar de Trump negar a inflação, os Estados Unidos têm sofrido com o aumento brutal do custo de vida, seja na compra de bens essências, creches e habitação.
Depois desta eleição, pergunta-se se o partido democrata será socialista ou se isto é apenas a exceção. Obviamente o partido veio já dizer que isto é a exceção, caindo na armadilha criada pelo partido republicano.
Outras vitórias importantes do Partido, como para governador de Nova Jersey ou Virgínia, ganharam duas candidatas consideradas moderadas. Mas a verdade é que tiveram promessas de campanha como congelamento do preço de bens como a água e energia, ou baixar o preço dos medicamentos. Mesmo nestas campanhas consideradas mais moderadas, vemos como propostas diretas para diminuir o custo de vida foi a estratégia vencedora.
Há muito que é impossível transpor para Portugal mas há várias coisas a aprender. A primeira é que a estratégia e a política têm de ser iguais. Não vale a pena fazer campanha se não for para falar da vida concreta das pessoas. Mas isso não significa repetir um discurso que lhes diga o quão cara e difícil a vida está, elas já sabem. Também não adianta fazer proclamações sobre estar do lado de quem trabalha ou repetir que o supermercado e a habitação estão demasiado caros. Já sabemos. Precisamos de propostas. Propostas especificas nas soluções e gerais em quem abrangem.
Outra lição destas eleições é que elas não podem ser sobre o resultado em si. É ótimo que Mamdani seja agora presidente da câmara, mas ele sabe que esse não é o objetivo final. O objetivo é garantir um movimento com força capaz de garantir a mudança. Ele enfrentará um sistema que não está desenhado para permitir mudanças profundas. Se precisou das pessoas para ganhar, vai precisar ainda mais delas para transformar o sistema. Resta saber se os nova-iorquinos estão dispostos a continuar esta luta nos próximos quatro anos. Não é por terem eleito alguém que a luta terminou, nem que agora apenas devem lutar os que trabalham diretamente na câmara. Pelo contrário: a luta começa agora. Nos últimos anos, a esquerda portuguesa avaliou o seu sucesso pelos resultados eleitorais e pela atenção mediática. Foi um erro. Criar pensamento político, comunidade e enraizamento é o que realmente importa. Saibamos fazer isso mesmo
