Em vésperas da celebração de 50 anos sobre a Revolução de 25 de Abril, rever algumas das circunstâncias que condicionaram e moldaram a vida particular e coletiva dos portugueses serve para que a memória não se perca e ajude a construir futuro.
Antes de mais, não se pense que tudo ficou diferente da noite para o dia. E os Capitães de Abril não tinham, eles próprios, noção da amplitude que o movimento iria adquirir quando começaram a reunir-se para tratar de questões de carácter corporativo e se colocaram no trilho de uma operação militar para mudar o regime. A inteligência e determinação de alguns propôs depois, como objetivos a alcançar, os famosos três dês: Descolonizar, democratizar, desenvolver.
A descolonização foi dolorosa para muitos portugueses que tinham sido levados a acreditar, pelo regime do Estado Novo, que havia novos brasis em África. E foi ainda mais dolorosa para os novos países independentes, que se envolveram em guerras civis muito mais longas e muito mais sangrentas do que as guerras de libertação. O país integrou aqueles cidadãos a que chamaram “retornados”, muitos dos quais não eram senão refugiados de guerra.
Podia, a descolonização, ter sido diferente? O contexto da política internacional depois da segunda guerra, a chamada guerra fria, potenciava a divisão do mundo em dois blocos de influência e alavancou os movimentos independentistas. Primeiro contra o colonizador, que insistia numa visão utópica de nação do Minho a Timor. Depois, no apoio uns contra os outros na disputa do poder. As circunstâncias ditaram o tempo e o modo da descolonização.
A democratização não foi imediata nem isenta de percalços. As eleições para a Assembleia Constituinte, em 25 de abril de 1975, foram um marco histórico de participação cívica e o seu resultado moderou e condicionou as tentativas de instauração de modelos de organização política copiados de presumidos paraísos do Leste ou do Oriente. A Constituição entrou finalmente em vigor em 25 de abril de 1976, data em que ocorreram também as primeiras eleições legislativas que deram lugar ao primeiro governo constitucional chefiado por Mário Soares. Muitos anos passaram e o crescente alheamento dos cidadãos em relação à participação nas instituições democráticas resulta, entre outras coisas, do fechamento destas sobre si mesmas, da falta de escrutínio e de transparência, da desvalorização do debate e da oposição. As assembleias municipais e de freguesia deviam assumir, por iniciativa própria e para promoção da democracia participativa, responsabilidades na alteração desta situação.
O desenvolvimento, económico, cultural e social, já começara a despontar na década anterior à revolução. Muitas mudanças não dependem das políticas, como aconteceu com a emigração para França ou para as cidades industriais do litoral. Outras, resultantes de políticas sectoriais como o alargamento da rede de escolas de ciclo e secundárias que já estavam no terreno e careciam de maior desenvolvimento. O Salário Mínimo e a Pensão Social são criações da revolução e melhoraram as condições de vida de muitos agregados familiares. Não há dúvida de que se vive hoje incomparavelmente melhor do que em 1974 e que o país está muito mais desenvolvido. A integração plena na União Europeia terá sido o ponto mais alto do desenvolvimento prometido na revolução.
É do desenvolvimento global a nível europeu que dependemos agora. Mas as guerras em curso e as ameaças de guerra que nos chegam nos noticiários, não auguram nada de bom.
Cinquenta anos depois do fim da (nossa) guerra colonial, como devemos, enquanto nação, encarar a defesa da nossa Europa contra agressões externas?