[Crónica] A campanha eleitoral mais vergonhosa de sempre

CRÓNICAS/OPINIÃO Napoleão Ribeiro

Os termos desta campanha foram longe demais e, infelizmente, o título da presente crónica não é um letreiro exagerado, usadopara captar a atenção do leitor. Na verdade, os termos usados por alguns políticos, nos últimos dias, são os trilhos que levam o país até ao precipício da escuridão.  

Convictos de que possuem a exclusividade da verdade, os candidatos da extrema-direita desprezam e desrespeitam a multiplicidade de opiniões e, pelo que se verifica das suas afirmações, querem mesmo transformar o país plural num país monolítico, dotado de uma só cor, inócua e fútil. Tiveram resultados consideráveis nas urnas, tanto no número de deputados, 58, como na percentagem obtida, 22.58%. Simultaneamente, obtiveram um corolário fantástico no que diz respeito à má educação. Inspirados nas grossarias de Trump e de outros opositores da Europa Social, dominam, cada vez mais, de forma minuciosa e inteligente, a calúnia e o insulto. Nos seus cartazes, produzidos dentro das regras do enquadramento legal, a máquina propagandística desta fação, direta ou indiretamente, colou pessoas a ideias menos boas e nunca promoveu um programa alternativo. Basta ver os outdoors e panfletos de berma de estrada. Já nos discursos, debates, entrevistas e ações de campanha, ofenderam e manipularam preconceitos contra partidos, imigrantes e minorias.

Nas legislativas 2025, uma das mais valias conseguidas pelo Chega, foi monopolizar e reduzir toda a campanha aos temas da imigração e das minorias étnicas. Como proferiram ofensas sobre grupos de pessoas, direta ou indiretamente, obtiveram grande cobertura por parte de uma comunicação social que, encrespada pela cedência ao algoritmo da audiência nas redes sociais, fez demasiados comentários, manchetes e análises sobre estes assuntos.

O peso do passado e da semente, cantado por Sérgio Godinho em “Liberdade”, está a perder dimensão perante a manipulação do medo coletivo, um esconjuro que, apesar de banal, repetitivo e corriqueiro, serve, na perfeição, para não discutir aquilo que são os problemas reais do país: a paz, o pão, a habitação, a saúde e a educação.

Num país com 10.400.000 habitantes, é demasiado vil assistir a discursos de ódio a uma minoria constituída por apenas 50.000 pessoas. Apesar de ideias semelhantes, creio que nem a elite política da ditadura salazarista algum dia se rebaixou ao nível das palavras utilizadas por boa parte dos candidatos da extrema-direita nas legislativas 2025. A deputada do Chega Cristina Rodrigues, surgiu no meio de uma feira, rodeada de gente do partido, entoando cânticos que, indireta e subtilmente, exortam os vendedores de etnia cigana “a trabalhar” quando, os mesmos, estavam ali, de facto… a trabalhar. No meio de inúmeros episódios, André Ventura sabe que sobe nas votações quando, em frente às câmaras televisivas, acicata pessoas desta minoria, acusando-as, por exemplo, de “gamar”. Seguidamente, e em jeito de marca branca, logo apareceu quem também o imitasse na corrida ao voto. E assim, todos vimos um candidato, que também é primeiro-ministro, a responder a uma pessoa, supostamente desta etnia, que, na plenitude normal dos seus direitos de cidadã, lhe pedia para baixar os preços dos bens alimentares. Creio que é algo perfeitamente normal e legítimo num contexto de qualquer campanha eleitoral. A resposta, em jeito de desprezo, foi mandar a senhora trabalhar. Não sei se o mesmo conhece a vida laboral da senhora. Eu ignoro-a, mas, quase de certeza, que a mesma nunca teve a oportunidade de estudar ou de obter conhecimentos para montar empresas lucrativas. Promover a democracia não equivale a subjugá-la a uma degradação da caça ao voto em que o ódio e o insulto se tornam rotina e prática comum. Conforme escreveu Fernando Pessoa, o que não faz sentido é o sentido que tudo isto tem.

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

13 + 17 =