[Crónica] Uma central elétrica inativa

CRÓNICAS/OPINIÃO Napoleão Ribeiro

Segundo a página de internet da Fundação EDP[1] em Santo Tirso, encontram-se registadas oito centrais elétricas, das quais, quatro funcionavam a fuelóleo (Pidre – Água Longa, com uma potência de 5.2MW; Paderne – São Martinho do Campo, com uma potência de 4.6MW; e duas no Arco – Santo Tirso, com potências de 5.3 e 4.7 MW); três a gás natural (Pidre II – Água Longa, com uma potência de 4.6MW; Fundelho e Campo – ambas em São Martinho do Campo, com potências de 3.6 e 7.5MW, respetivamente) e uma a fio de água (Boavista – Rebordões, com uma potência de 4.4MW). Todas perfazem uma potência total de 39.9MW.

No mesmo sítio, a Fundação EDP noticia a existência do processo de licenciamento de projetos para mais quatro centrais no concelho, três das quais a gás natural (Fábrica Rio Vizela, em São Tomé de Negrelos, com uma potência de 6.9MW; Ermida, em Santa Cristina do Couto, com uma potência de 2.3MW; e na Fábrica de Tecidos de Vilarinho, com uma potência de 1.6MW) e uma a fuelóleo (em Paderne – São Martinho do Campo, com uma potência de 5.2MW), que, no seu todo, possuem uma potência de 16MW, o que, somado à potência existente, podem vir a perfazer um somatório de 55.9MW.

 Além disso, nas margens dos rios do concelho, estão ainda instaladas mais quatro centrais a fio de água, mas cujas sedes fiscais estão nos municípios de Famalicão e Guimarães, já no distrito de Braga[2], nomeadamente as do Amieiro Galego e Caniços, em Bairro, com potências de 1.33 e 0.9 MW, respetivamente; e as do Caneiro e Pereirinhas, em Moreira de Cónegos, Guimarães, com potências de 1,8 e 1,32MW.

A página da Fundação EDP é omissa no que diz respeito às antigas centrais elétricas movidas a água, situadas em Vila das Aves, São Tomé de Negrelos e Rebordões, outrora propriedade da antiga Fábrica de Fiação e Tecidos Rio Vizela, Lda., assim como de outras empresas que instalaram turbinas de geração de energia elétrica nas margens do maior afluente do Ave.

Destas, uma das mais marcantes, é, sem dúvida, a Central Elétrica de Caniços/São Pedro, localizada no lugar de Cense, Vila das Aves, junto à ponte ferroviária, na margem sul do Vizela, a poucos metros de distância da foz deste no rio Ave. Hoje, este pequeno complexo hidráulico, encontra-se ao abandono, entre a vegetação que o envolve. O seu estado de conservação ainda parece minimamente razoável. Contudo, se o abandono continuar, o edifício arruinará em poucos anos. A arquitetura singular da casa das máquinas e das suas barreiras hidráulicas, em granito talhado à mão, fazem com que esta seja uma estrutura única do património industrial do Vale do Ave, datada de 1908. Por outro lado, a responsabilidade do impacto ambiental e paisagístico da mini-hídrica não pode ser esquecida, até porque também possui condicionantes administrativas de utilidade pública no domínio hídrico. Se a estrutura existe, deveria funcionar.

Salmão Atlântico. Retirado de: https://www.rarefishprints.com/rev-w-houghton-fish-prints/the-grilse-or-young-atlantic-salmon-print.html consultado a 21 de abril de 2025

Num tempo em que a “World Wildlife Fund for Nature” e a União Europeia têm mobilizado inúmeras pessoas e meios para remover e/ou reestruturar barreiras fluviais que se encontram ultrapassadas (pois impedem o fluxo natural dos rios e a migração de espécies aquáticas), não faz sentido assistirmos ao desperdício da força motriz de uma fonte energética renovável. Recuperar, verdadeiramente, a bacia hidrográfica do Ave não passa só pela despoluição das suas águas. Além da recente rearborização da galeria ripícola, ainda faltam, por exemplo, realizar ações como: a) revitalizar o seu património industrial, moageiro e etnográfico; b) controlar espécies exóticas de plantas e animais infestantes, como a erva aquática jacinto-de-água – (Eichhornia crassipes) ou os peixes perca-sol (Lepomis gibbosus) e o peixe-gato-europeu (Silurus glanis); b) e colocar passagens para peixes, de jusante para montante, em todos os açudes, mini-hídricas e barragens, de forma a que as espécies autóctones possam, novamente, subir até aos locais de desova.   

Como é comumente sabido, o Ave foi um rio que, além de salmão, possuía inúmeras lampreias, espécies cujo desaparecimento se deveu à construção das mini-hídricas edificadas a partir da primeira década do século XX. Veja-se, por exemplo, no Jornal de Santo Thyrso de 28 de julho de 1887 (Ano VII, n.º 273, p.2) a notícia de que, um pouco a jusante da ponte de Santo Tirso, foi pescado um salmão com 1m de comprido e 7kg de peso. Duas décadas depois, as migrações destes peixes, rio acima, até aos riachos onde nasceram, nas montanhas da Cabreira e do Maroiço, foram totalmente impedidas, dado que por muito alto que saltem, estas barreiras ficaram intransponíveis para sempre… ou não.


[1]PINTO, Ricardo – Centrais Elétricas no Distrito do Porto. Fundação EDP, s/d. Disponível in https://www.colecoesfundacaoedp.edp.pt/nyron/library/catalog/winlibimg.aspx?skey=F9FBEC1CFEBA4BF3A9B002F08DE8A0C9&doc=187614&img=180292 consultado a 13 de abril de 2025.

[2]PINTO, Ricardo – Centrais Elétricas no Distrito de Braga. Fundação EDP, s/d. Disponível in https://www.colecoesfundacaoedp.edp.pt/nyron/library/catalog/winlibimg.aspx?skey=64F7BD4CAAC644879B2848EB41E7D207&doc=187601&img=180279 consultado a 13 de abril de 2025.

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