«Todos têm direito, para si e para a sua família, a uma habitação de dimensão adequada, em condições de higiene e conforto e que preserve a intimidade pessoal e a privacidade familiar». Este é o texto presente na Constituição da República Portuguesa.
No entanto, a falta de habitação acessível em Portugal, tem atingido nos últimos anos limites incomportáveis. As rendas das casas aumentaram 42% desde 2017, segundo a imobiliária idealista. Escusado será dizer que os salários não acompanharam, nem de perto nem de longe, este aumento do custo das casas. A falta de habitação a preços acessíveis para arrendar tem deixado milhares de jovens em casa dos pais sem possibilidade de pensar no seu futuro familiar ou em situação de pobreza. Muitas famílias que arrendam casa dedicam uma parte substancial do seu rendimento à mesma, colocando-as demasiado vulneráveis a qualquer imprevisto.
Este aumento exorbitante no valor das rendas empurrou bastantes portugueses à compra de casa própria. Com os juros baixos nos últimos anos, para quem tivesse capacidade financeira de ter uma entrada inicial, ficava mais acessível pagar a prestação ao banco do que uma renda. Recentemente, o Banco Central Europeu (BCE), tomou a decisão política de aumentar as taxas de juros. Uma medida que já mostrou ser completamente ineficaz no combate à inflação, aumentando a pobreza e a desigualdade. Para combater a inflação é necessário o controlo dos preços e das margens de lucro. Assim, este aumento nas taxas de juros fez disparar as prestações dos empréstimos à habitação. Muitas vezes com aumentos que significaram para as famílias uma subida acima do limite da sua capacidade de esforço. Tudo isto tornou o cenário perfeito para uma grave crise da habitação a que qualquer resposta já peca por tardia.
Na última semana o governo anunciou um pacote de medidas para responder a esta crise. Um conjunto de medidas avulsas entre as quais o fim dos vistos gold (finalmente!), simplificação dos processos de licenciamento, arrendamento por parte do estado aos senhorios para poder subarrendar ou apoios para rendas. Estas medidas têm um aspeto importante de salientar: em nenhum momento baixam os preços das rendas ou tocam nos lucros dos senhorios e dos bancos. É um pacote de medidas que em nada resolve os problemas graves da habitação e que coloca o dinheiro dos contribuintes a pagar a quem ganhou com a especulação.
Nos últimos dias este pacote tem sido apelidado de socialista ou radical. Infelizmente, nada perto da verdade. Um programa socialista seria o que teria a coragem de tocar nos lucros da banca para ajudar as pessoas. E seria um em que os apoios não chegariam quando as pessoas estendessem o braço ao governo mas sim como direitos sociais inscritos na lei, tratando a habitação como deve ser, um direito! Estas medidas avulsas criam um país de braço estendido ao governo, à espera que alguma medida signifique que terá algum mísero apoio. Tudo isto enquanto quem ganha com a especulação imobiliária continuará a ganhar e em que a banca continuará a lucrar como nunca. Em cima disto, é usar o dinheiro de todos os contribuintes para dar um conjunto de borlas fiscais a quem mais tem ganho nos últimos anos à custa da crise de tantos. Temos um governo incapaz de apresentar soluções reais, um governo que apenas encontra medidas liberais e compatíveis com o “mercado”, quando foram essas mesmas coisas que nos deixaram chegar até aqui.
No próximo dia 1 de abril espera-se em Portugal uma das maiores manifestações desde o tempo da troika. Uma manifestação pelo direito à habitação. Encontramo-nos lá!