Joaquim Fernandes, mestre do Shotokan de Vila das Aves e árbitro internacional de renome, explica ao Entre Margens o que faz a modalidade ter tantos praticantes, a sua implementação na comunidade avense e o que pode mudar na modalidade pós estreia olímpica, em Tóquio.
O tatami colorido no dojo do Karaté Shotokan de Vila das Aves é casa para Joaquim Fernandes. Praticamente da modalidade há mais de quatro décadas, dedica-se ao ensino da arte marcial de origem japonesa há trinta e quatro, sendo o seu nome quase sinónimo para muitos avenses.
O “Mestre”, como é afetuosamente reconhecido, recebeu o Entre Margens na véspera da partida para a Croácia, onde será Chefe de Tatami no Campeonato da Europa de karaté que se realiza entre 19 e 23 de maio. Em ano de estreia da modalidade nos Jogos Olímpicos, Joaquim Fernandes traçou o perfil do atleta, as características da modalidade e o que pode mudar com a presença no programa olímpico.
Acabou por não ser selecionado para arbitrar em Tóquio, mas nem por isso vai perder um segundo da ação por terras do sol nascente. E admite, chegar aos Jogos é um sonho e um objetivo.
O Karaté Shotokan de Vila das Aves é uma das instituições desportivas mais medalhadas do concelho. Como é que se mantém este nível de qualidade ao longo de todos estes anos?
O meu lema ao longo da vida foi “aprender mais para ensinar melhor” e desde o início fazia todas as formações que tinha conhecimento. Para se fazer um competidor, não é difícil, nem é preciso saber muito. Mas para se fazer um campeão, sim. É preciso estar sempre à frente numa conjugação de conhecimentos. Tenho que saber ensinar, mas o atleta tem que saber aprender, estar motivado para treinar seis vezes por semana e executar no momento certo. Se virem o mestre dedicado, imediatamente percebem o incentivo.
Sente o peso da responsabilidade que tem na comunidade?
Quando abri o clube de karaté, trabalhava no café do cinema e isso foi visto com muita desconfiança, porque quem praticava karaté era tido como um grupo de arruaceiros. Olhavam com desconfiança, para mim e para os meus alunos. Com o passar dos tempos e com o bom comportamento na sociedade dos meus alunos, com os resultados que começaram a conquistar, tudo foi sendo ultrapassado. Começamos a ganhar o respeito e admiração da sociedade. Sinto a responsabilidade, sim, de querer manter resultados e representar Vila das Aves por todo o mundo.
Qual diria que foi o seu momento alto enquanto árbitro?
Sempre que somos chamados para arbitrar finais de campeonatos da europa e do mundo, é um momento alto. Mas estar nos Jogos Europeus em 2015 em Baku e depois em 2019 em Minsk, na Bielorrússia. Para essas competições foi feita uma seleção de 23 árbitros europeus de topo da carreira, quando em toda a europa há perto de duzentos. Estar nesse lote deixou-me muito satisfeito. Valeu a pena apostar na carreira. Fui para a arbitragem por paixão, sem esperar nada, mas por muito humildes que sejamos, ter esse trabalho reconhecido pelos meus pares é ótimo. Muitos podem não saber o meu nome, mas sabem que sou português.
Com um ano de atraso, o karaté vai estrear-se nos Jogos Olímpicos em Tóquio. Porque demorou tanto tempo?
Dentro da própria modalidade, alguns mestres mais antigos consideravam que entrar no programa olímpico poderia desvirtuar o karaté. Para mim isso é um erro crasso. Perderam-se aqui muitos anos, porque uma modalidade olímpica tem muito mais apoios, não só em Portugal, mas a nível mundial.