Recentes podas drásticas de árvores do espaço público são tema de conversa na comunidade. Afinal, que cuidados e proteção merecem? Que legislação existe para garantir que o futuro dos centros urbanos seja garantidamente verde?
Em maio de 2021, o Entre Margens deu a conhecer através de uma reportagem as árvores que, no concelho de Santo Tirso se encontram classificadas como de interesse público, dando conta que apenas três árvores isoladas e dois conjuntos arbóreos se encontram nesse desígnio. Na cidade, por exemplo, está classificado, desde 1940, o conjunto de plátanos da alameda da ponte, mas não foi ainda feito o registo do conjunto de plátanos do Parque Dª. Maria II, nem o dos Carvalhais.
De acordo com o Instituto de Conservação da Natureza (ICNF), “o Arvoredo de Interesse Público compreende exemplares isolados ou conjuntos arbóreos que, pela sua representatividade, raridade, porte, idade, historial, significado cultural ou enquadramento paisagístico, possam ser considerados de relevante interesse público e se recomenda a sua cuidadosa conservação.”
Muito embora legislação de 2021 estabeleça regras para a gestão do arvoredo urbano integrante do domínio público e privado municipal, a classificação será sempre uma garantia extra de proteção, visto que a árvore ou conjunto classificado adquire ume estatuto similar ao do património construído classificado. O arvoredo classificado beneficia de uma zona geral de proteção, que visa proporcionar condições essenciais ao normal desenvolvimento de cada exemplar e a sua proteção de impactos decorrentes de obras ou atividades que o possam danificar.
O interesse da árvore ornamental está ligado à sua contribuição para a qualidade de vida urbana, tendo em conta as suas características de folhagem caduca ou perene e suas vantagens, pelo seu porte, silhueta, cor, floração e cheiro, por atenuar níveis de ruído, libertar oxigénio e reduzir níveis de dióxido de carbono, por beneficiarem espaços de lazer, de recreio e de socialização e por definirem a paisagem urbana.
No espaço urbano de Vila das Aves, e de há algum tempo a esta parte, houve transformações muito significativas no património arbóreo e não é seguro que tenham sido sempre tidas em conta as mais elementares regras de proteção da natureza.
O arvoredo da Avenida Conde de Vizela foi sacrificado pela proximidade da linha do caminho-de-ferro, com quem conviveu dezenas de anos e pelo menos uma dezena desses anos já com a catenária elétrica. Das tílias do mercado, há meia dúzia de sobreviventes de uma poda radical há cerca de dez anos.
Em várias ruas, as árvores ornamentais prejudicam o piso dos passeios, daí que o seu abate seja uma forma fácil de resolver um problema, cortando o mal pela raiz. Não haverá outra maneira, seja pela escolha das espécies a plantar, seja pelo desenho das “caldeiras” onde são plantadas? Aliás, a supressão de umas quantas árvores deveria ser sempre acompanhada pela plantação de outras tantas pelo menos.
Recentemente foram retiradas várias tílias da Alameda Padre Álvaro Guimarães, junto à Igreja Matriz, e, se é verdade que havia razões de segurança a ter em conta, não se sabe se foi estudada alguma alternativa de solução menos drástica. Provavelmente, terá mesmo sido a retirada das tílias da frente que desprotegeu o exemplar que acabou por cair e provocou alguns danos no edifício da Igreja. Já antes, haviam sido retirados alguns exemplares de plátanos centenários tendo, os resistentes, sido alvo de poda de rolamento. O mesmo aconteceu no adro do lado sul, transformando por completo o aspeto de toda a envolvente.
Restam, mantendo o porte e a dignidade, nas proximidades da Igreja alguns exemplares, sendo estes do domínio público municipal e, portanto, sujeitos ao disposto na lei 59/2001, que estabelece a obrigação municipal de definir um regulamento municipal de gestão do arvoredo em meio urbano. É de esperar que uma intervenção enquadrada por essa lei, permita verificar a consistência dos procedimentos até agora adotados.
De acordo com informação disponível no ICNF, as podas drásticas podem ter consequência deficiências nutritivas por prejudicarem o equilíbrio entre o sistema radicular e a copa, diminuindo a fotossíntese, por retomarem um falso vigor já que os novos ramos serão frágeis e instáveis e porque nas zonas de corte se formarem zonas de fácil acesso a genes patogénicos e cancros e podridão. Existem, aliás, processos de cálculo do valor patrimonial das árvores ornamentais e este valor é tanto maior quanto mais características naturais elas tiverem.
A lei que “caracteriza e regula as operações de poda, os transplantes e os critérios aplicáveis ao abate e à seleção de espécies a plantar”, estabelece também a elaboração de “um inventário completo do arvoredo urbano existente em domínio público municipal e domínio privado do município”, incluindo “o número, o tipo e a dimensão das espécies arbóreas existentes nas zonas urbanas e urbanizáveis do município”.
Dar sequência ao que a lei prevê é oportunidade também para o inventário do arvoredo suscetível de classificação e nesse se inclui também arvoredo de domínio privado. A classificação de todo o conjunto arbóreo das imediações da Igreja de Vila das Aves deve ser encarada com naturalidade. E a reposição de novos exemplares da mesma espécie dos que foram sacrificados deveria ser uma exigência.