Jovem que frequentou a Escola Secundária D. Afonso Henriques entrou na licenciatura de Engenharia Física na Faculdade de Ciências da Universidade do Porto com uma média de 19,62 valores. Sonho passa por deixar a sua marca no mundo que a rodeia.
O ensino secundário é sempre um desafio escrito sob o desígnio da ansiedade, sobretudo para os alunos com ambições no ensino superior. Mas para a geração que agora se vê colocada em licenciaturas e universidades da sua preferência, o caminho foi duplamente mais atribulado. Já não bastavam os obstáculos quotidianos para qualquer jovem estudante, estes que agora se despediram no ensino obrigatório viveram os últimos três anos a navegar uma pandemia que lhes virou as vidas do avesso, preenchendo o seu futuro com pontos de interrogação.
Ana Raquel Casteleiro é o rosto de toda esta geração. A jovem avense que frequentou a escola secundária D. Afonso Henriques acabou de ser colocada na licenciatura em Engenharia Física da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto com uma média de entrada de 19,62 valores, a mais alta de todo o concelho. Ao Entre Margens, não escondeu os momentos difíceis que passou durante os longos meses de ensino à distância que, mesmo assim, nunca lhe retiraram o foco dos objetivos que tinha à entrada do secundário.
“Não foi nada fácil”, admite. “Psicologicamente foi muito complicado. Estive mesmo com dificuldades em lidar com todo o stress de estar fechada em casa, de todos os trabalhos e avaliações”.
Se a mudança do básico para o secundário, por si só, é um grande passo na vida de qualquer jovem, fazê-lo em plena pandemia de covid-19, num contexto de medidas restritivas e apertadas, torna tudo muito mais delicado. Falta o contacto humano, a vida em comunidade que só a escola em contexto presencial consegue providenciar. E nem as tecnologias permitiam suprir essa lacuna. Aliviam, mas não são a mesma coisa.
“Não sei muito bem se consegui lidar, sinceramente”, diz. “Apercebi-me que não gosto da transição digital que foi acelerada durante este período de pandemia. Voltar para a escola, ter os meus amigos, ver toda a gente no intervalo é algo completamente diferente. Toda aquela interação com as pessoas tranquilizou-me”.
O contexto pandémico fez com que se criassem dois momentos distintos para esta geração de alunos. Numa primeira fase, com as aulas à distância e uma segunda fase marcado pelo regresso à rotina habitual da escola no seu espaço físico. Dois cenários que provocaram reações bem diferentes.
“Quando olho para trás, vejo que houve alturas no 10º ano em que coloquei a escola à frente da minha saúde”, explica Ana Raquel Casteleiro, uma atitude provocada por um misto entre as suas próprias expectativas enquanto aluna e a mensagem transmitida aos jovens de que no secundário não há margem para erro para quem pretende ingressar no ensino superior com notas de topo. Algo que se dissipou com o passar do tempo. “Sim, quero tirar boas notas, mas também vou sair, aproveitar, fazer as minhas coisas”, realçou.
Nunca se privou de fazer aquilo que gosta nos seus tempos livres, embora tenha noção que estuda “mais do que outros colegas” rejeitando, no entanto, a caricatura dos alunos de topo como jovens que apenas passam os dias a “estudar, estudar, estudar”.
Aliás, no 12º ano foi mesmo eleita presidente da associação de estudantes da escola secundária cargo que pode parecer meramente simbólico, mas que na verdade teve de gerir e conciliar com os estudos. Um trabalho que lhe ocupava grande parte do tempo livre, mas que mesmo assim diz ter gostado imenso.
“Quero deixar a minha marca”
Os 19,62 valores de média de entrada em Engenharia Física fizeram de Ana Raquel Casteleiro a melhor aluna do concelho, seguida de um outro colega da D. Afonso Henriques, Gonçalo Certo, que entrou em Engenharia Aeroespacial na Universidade do Minho com 19,52 valores; de Inês Martins, da Tomaz Pelayo, com 19,48 valores também em Engenharia Aeroespacial no Minho; e de Maria Castro, da D. Dinis, que entrou em Medicina Veterinária na Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro com 19,42 valores.
A pergunta que se impõe, então, é porquê Engenharia Física? Não é Medicina, a tradicional área para os alunos com as notas mais elevadas. Nem esta Engenharia Aeroespacial, tão na moda nos dias que correm.
“Quando cheguei ao secundário apercebi-me que gostava muito de físico-química, sobretudo da área da física. Quando fiz a minha pesquisa de cursos relacionados com a área, claro que havia a Engenharia Aeroespacial, mas não era bem aquilo que pretendia. Até que encontrei Engenharia Física que tinha cadeiras relacionadas com o espaço, relatividade e mecânica”. Um instinto que foi confirmado depois de participar em duas escolas de verão na área, quer no Porto, quer no Instituto Superior Técnico, em Lisboa.
Com o início do ano letivo mesmo à porta, Ana Raquel Casteleiro diz que tem duas grandes preocupações neste momento. Primeiro, completar o curso que dizem ser “difícil”. Depois, o trabalho.
“Ainda não tenho a certeza do que quero fazer”, confessa. “Nunca tive a exata noção do que queria fazer em concreto, mas sempre senti que queria fazer a diferença e deixar a minha marca. Pode parecer muito lamechas, mas é o que sempre senti. Quero fazer diferença para que um dia, as pessoas se lembrem de mim”.
Se é na área da física ou noutra, logo se verá. Este é o tempo de abrir portas e horizontes. O futuro, certamente, apresentar-se-á no momento oportuno.