[EDITORIAL] A propósito de orçamento

Diretor

O Orçamento de Estado para 2022 tem dado que falar. Com anunciada votação do PCP e do Bloco de Esquerda, a expectativa que subsiste na data em que preparamos esta edição do Entre Margens é a de realização de eleições antecipadas, por falta de acordo entre o partido que governa e aqueles que foram o seu suporte em anos anteriores. A importância do orçamento na governação não carece, por isso, de outras demonstrações.

Por comparação com o que se passa a nível central, podemos colocar a questão de saber até que ponto os orçamentos municipais e de freguesia são também condicionantes efetivos da governação local. Como não tem havido notícias da necessidade de eleições antecipadas em órgãos da administração local por motivo de rejeição de orçamentos, podemos concluir que o problema não existe?

No caso da autarquia municipal, o orçamento é elaborado pela câmara municipal, que depois de o aprovar em reunião do executivo, o apresenta à assembleia municipal, que o debate e submete à votação. Há pelo menos dois motivos que fazem com que o processo seja habitualmente pacífico. Um é o facto de, de modo geral, haver uma proporção idêntica de lugares na assembleia e no executivo camarário que quase garante a aprovação sem necessidade de aprofundamento do debate. O outro é a falta de preparação e de disponibilidade dos deputados municipais para efetuar uma análise aprofundada dos documentos, até porque também não dispõem de assessorias e nem sequer de gabinetes de trabalho adequados.

O debate é obrigatoriamente feito com a presença da câmara, que, através do seu presidente, defende os seus pontos de vista perante os deputados municipais. Uma eventual mas pouco provável rejeição, nunca acarretaria, no entanto, a queda do executivo e eleições antecipadas, dada a independência dos dois órgãos. No caso, a solução seria elaborar novo documento.

“Numa situação ideal, todo o orçamento seria participativo e participado pelos eleitores. Numa democracia representativa a funcionar em pleno, o orçamento seria participado pelos eleitos, sendo que, habitualmente, pouco mais é dado, às oposições, do que uma oportunidade de fazer algumas sugestões”

Américo Luís Fernandes

Nas freguesias o panorama é semelhante. Mas nestas, o executivo depende diretamente da assembleia e deveria ser esperável maior aprofundamento do debate, até porque há menos complexidade na documentação e maior conhecimento e proximidade em relação aos objetivos.

A realidade é que os orçamentos locais e municipais não são, de modo geral, nem um assunto que mereça cuidados especiais de apresentação e de negociação nem uma limitação à escolha e definição de projetos e programas.

A abertura das instituições autárquicas aos orçamentos participativos e, concretamente, no nosso município, ao Orçamento Participativo Jovem, não tem passado de algo simbólico, previamente balizado no orçamento municipal por um teto orçamental inalterável.

Numa situação ideal, todo o orçamento seria participativo e participado pelos eleitores. Numa democracia representativa a funcionar em pleno, o orçamento seria participado pelos eleitos, sendo que, habitualmente, pouco mais é dado, às oposições, do que uma oportunidade de fazer algumas sugestões.

Melhorar a qualidade da governação autárquica deveria conduzir a melhor capacidade de definir planos e orçamentos compatíveis, por um lado, com as propostas eleitorais apresentadas pelos seus autores e, por outro lado, com as efetivas necessidades, expetativas e prioridades das populações, se necessário expressamente consultadas para o efeito, numa perspetiva de participação continuada.

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